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Perspectivas

A morte do trabalhador automotivo Ronald Adams Sr. e a lei do lucro capitalista

Publicado originalmente em inglês em 5 de agosto de 2025

Estamos publicando a seguir o discurso de David North, presidente do Conselho Editorial Internacional do WSWS e presidente nacional do Partido Socialista pela Igualdade (EUA), no fim da audiência pública de 27 de julho sobre a investigação da Aliança Operária Internacional de Comitês de Base (AOI-CB) a respeito da morte do trabalhador da Stellantis Ronald Adams Sr.

Adams, um trabalhador experiente de 63 anos, foi esmagado por um pórtico elevado no complexo de motores de Dundee, no estado de Michigan, em 7 de abril, sob circunstâncias que ainda não foram explicadas pela empresa, pelo Sindicato dos Trabalhadores Automotivos (United Auto Workers) ou pela Administração de Segurança e Saúde Ocupacional de Michigan (MIOSHA).

A audiência teve a participação de 100 trabalhadores, jovens e membros da comunidade. Ela contou com o discurso de Shamenia Stewart-Adams, viúva de Adams, e contundentes informes de Will Lehman, trabalhador da Mack Trucks e membro da AOI-CB, de Jerry White, repórter das lutas operárias do WSWS, e de outros trabalhadores da indústria automotiva e de base dos EUA.

Declarações internacionais de solidariedade à investigação também foram enviadas da Turquia, Austrália, México, Sri Lanka, Brasil e Nova Zelândia.

A reunião adotou por unanimidade uma resolução para continuar e expandir a investigação, estabelecer comitês de segurança de base e construir uma campanha internacional para defender as vidas e os direitos dos trabalhadores.

Para se envolver na investigação ou para informar sobre mortes e acidentes de trabalho, clique aqui.

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Em nome do Partido Socialista pela Igualdade, gostaria de estender nossas condolências e nosso sincero acolhimento à família de Ronald Adams. Agradecemos muito os comentários e a coragem de Shamenia em falar aqui hoje.

Esta não é uma experiência fácil para você e sua família. Vocês sofreram uma perda irreparável. Não há como mitigar essa realidade. Mas espero que tenha ficado claro, ao longo dessa discussão, que a experiência de vocês não é isolada. Em todo o mundo, trabalhadores conseguem se identificar com a experiência pela qual vocês passaram.

Ronald Adams Sr., sua esposa Shamenia e membros da família. [Photo by Adams Family]

A realidade é que podemos ter certeza, com base nas estatísticas, que enquanto estivemos aqui reunidos nas últimas duas horas, centenas, senão milhares, de trabalhadores em todo o mundo sofreram ferimentos, e muitos foram mortos. 

Sabemos que isso não será resolvido expressando condolências. Sabemos que aqueles que afirmam ter responsabilidade pelo destino dos trabalhadores, em particular as organizações sindicais, não farão nada para impedir isso. 

Há cerca de 52 anos, fui para o estado de Ohio cobrir as lutas da classe trabalhadora em grandes indústrias. Esse foi um período de enorme militância de base. Enquanto estava em na cidade de Lorain, que era um centro de manufatura de aço, encontrei um pequeno informe no jornal local sobre a morte de um jovem trabalhador chamado Rick Hertzig na fábrica National Tube em Lorain.

Hertzig foi morto em um evento muito semelhante àquele que matou Ronald Adams, exceto que Rick era um trabalhador muito inexperiente, enquanto Ronald era muito experiente. Um enorme equipamento atingiu este jovem trabalhador, Hertzig, e o matou instantaneamente. Ele tinha apenas 20 anos. Deixou para trás uma criança de um ano, uma jovem viúva e uma família devastada. 

Da esquerda para a direita: a esposa de Rick, Martha, o pai, Joe, e a mãe, Bertha Hertzig. [Photo: WSWS]

Hoje estamos aqui, 52 anos depois, e as mesmas coisas estão acontecendo todos os dias. 

Vivemos no meio da maior revolução científica da história, um desenvolvimento impressionante da tecnologia, e ainda assim as medidas mais elementares não são tomadas para proteger a vida dos trabalhadores. A coisa mais perigosa que um trabalhador pode fazer todos os dias é ir ao trabalho. Nenhuma família pode ter certeza de que, ao final do dia, não receberá de repente notícias devastadoras sobre algo terrível que aconteceu na fábrica ou no local de trabalho. 

Até agora, falamos apenas sobre acidentes industriais. Não tratamos da intoxicação diária que ocorre dentro das fábricas, nos locais de trabalho, nos bairros. Não abordamos a questão do aquecimento global e a destruição do meio ambiente. 

O termo acidente é frequentemente utilizado, mas essa palavra é adequada? Se formos mudar as coisas, precisamos começar a entender a causa do que são chamados de “acidentes” e reconhecer que, dentro desses acidentes, estamos vendo a operação de uma lei.

Se você atravessar a sala e tropeçar, isso pode ser um acidente. Quando ocorrem ferimentos e mortes com uma regularidade espantosa, dia após dia, hora após hora, minuto após minuto, segundo após segundo — esses já não são meros acidentes no sentido convencional da palavra. Estamos vendo a operação da necessidade.

Essas tragédias são o produto da forma como o sistema em que vivemos está organizado, não apenas neste país, mas em todas as partes do mundo. Nossa vida social, nossa vida econômica, é organizada de uma maneira que produz continuamente esses desastres, e eles continuarão até que um caminho seja encontrado para pôr fim ao sistema que os produz. 

Qual é o sistema? Que organização social é essa? É o sistema capitalista. De onde vem toda essa riqueza? De onde vêm os trilhões de dólares no bolso de um punhado de pessoas? A riqueza vem da transformação do trabalho dos seres humanos, o que é chamado de força de trabalho, que os capitalistas compram dos trabalhadores sob a forma de salários. 

Toda a operação do sistema depende da transformação do trabalho em lucro, no que Marx chamou de mais-valia. Quando empregam trabalhadores, os capitalistas estão interessados em apenas uma coisa: quanto de riqueza aquele trabalhador pode contribuir para sua própria fortuna? As máquinas não geram dinheiro. Elas precisam ser colocadas em movimento. É o trabalho dos trabalhadores que põe essas máquinas em movimento ou adiciona, de uma forma ou outra, valor ao processo produtivo que faz todo esse sistema operar.

Do ponto de vista da classe capitalista, tudo depende da transformação do trabalho em mais-valia e lucro. Para alcançar isso, serão tomadas todas as medidas para garantir o maior nível de exploração.

Devemos entender que é o próprio sistema que produz essas tragédias, um sistema que opera em benefício de outra classe, que possui as corporações, que extrai valor e lucro do trabalho dos trabalhadores. Em resposta, precisamos construir um movimento na classe trabalhadora. É antes de tudo necessário que os trabalhadores tenham consciência desse sistema e, com base nisso, tomem medidas, transfiram o poder para os trabalhadores no chão de fábrica, iniciem um movimento em escala internacional que tome o controle da organização da sociedade em benefício das amplas massas dos trabalhadores. 

Sejamos francos: Estamos vivendo em um mundo onde todos os dias lemos sobre horrores indescritíveis — mortes industriais, a intoxicação do meio ambiente, o genocídio de populações inteiras, como vemos agora na Palestina, e o gasto de trilhões em preparação para a guerra. Este é o sistema no qual trabalhamos.

Se esse sistema precisa ser mudado, isso requer a intervenção da classe trabalhadora, a luta para construir um movimento social e político de massa.

Participantes da reunião da AOI-CB sobre a morte de Ronald Adams Sr. em 27 de julho de 2025. [Photo: WSWS]

Esta reunião foi organizada pelo Partido Socialista pela Igualdade e pela Aliança Operária Internacional de Comitês de Base (AOI-CB). Ela foi organizada e essa luta irá continuar porque é baseada por uma perspectiva. Não estamos esperando que a classe dominante resolva esse problema. Ela é incapaz de resolvê-lo. Mesmo que quisesse, a operação de seu sistema econômico determina suas ações.

A mensagem que apresentamos hoje é que é fundamental levar essa luta para as fábricas, para os locais de trabalho, construir a AOI-CB como um poderoso instrumento de luta da classe trabalhadora nos Estados Unidos e internacionalmente, e conectar essa luta a uma luta para mudar a própria natureza do sistema político e social sob o qual vivemos. 

Você não pode combinar o capitalismo com os interesses da classe trabalhadora. Se algum desses problemas sociais precisam ser abordados, isso exigirá a construção de um movimento socialista. Não há como escapar dessa verdade.

Fundamentalmente, o socialismo significa a transferência de poder para a classe trabalhadora e a reorganização da sociedade com base nos interesses das amplas massas.

Eu olho para você, Shamenia, e para seus filhos e netos. Vamos garantir que o mundo em que vocês cresçam seja um mundo onde tais horrores nunca mais aconteçam. E quando você envelhecer, quando falar sobre o que aconteceu com seu avô e seu pai, dirá que assim era nos velhos tempos, antes de a classe trabalhadora avançar, entender o que estava acontecendo, mudar o mundo e torná-lo digno de viver. É isso que estamos buscando fazer. Junte-se a nós e ajude a construir este movimento.

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