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Trump impõe tarifas de 50% ao Brasil em resposta ao julgamento do ex-presidente fascista Bolsonaro

Ex-presidente Jair Bolsonaro e comandantes das Forças Armadas, almirante Almir Garnier Santos, general Paulo Sérgio Nogueira, e brigadeiro Carlos Baptista Júnior

Em uma medida extraordinária de intimidação imperialista, o presidente Donald Trump anunciou na quarta-feira a imposição de tarifas de 50% sobre todos os produtos exportados pelo Brasil aos Estados Unidos. Ele vinculou diretamente o ataque comercial contra o país sul-americano ao julgamento em andamento do ex-presidente Jair Bolsonaro pela tentativa de golpe fascista de 8 de Janeiro de 2023, que Trump chamou de “Caça às Bruxas”.

A carta oficial enviada ao presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva, do Partido dos Trabalhadores (PT), anuncia em seu primeiro parágrafo:

A forma como o Brasil tem tratado o ex-presidente Bolsonaro, um líder altamente respeitado em todo o mundo durante seu mandato, inclusive pelos Estados Unidos, é uma vergonha internacional. Este julgamento não deveria estar ocorrendo. É uma caça às bruxas que deve terminar IMEDIATAMENTE!

Além disso, o presidente dos EUA criticou o Supremo Tribunal Federal (STF) por ter alterado recentemente o Marco Civil da Internet do país, ampliando a responsabilidade das plataformas digitais por conteúdos ilegais publicados pelos usuários, mesmo sem uma ordem judicial. Essa decisão entra em conflito com um decreto presidencial emitido no final de janeiro por Trump, que chegou ao poder em estreita aliança com os oligarcas donos das principais redes sociais.

A carta atribuiu a imposição das tarifas, “a partir de 1º de agosto de 2025”,  “em parte aos ataques insidiosos do Brasil às eleições livres e aos direitos fundamentais de liberdade de expressão dos americanos”. 

A primeira acusação – que implica numa caracterização do regime brasileiro como uma ditadura – é uma suposta referência à impossibilidade de Bolsonaro concorrer às eleições presidenciais de 2026. Em 2023, ele foi declarado inelegível pelo Tribunal Superior Eleitoral por seus ataques antidemocráticos ao sistema eleitoral brasileiro.

Já a referência aos “ataques insidiosos” aos “direitos de liberdade de expressão dos americanos” refere-se às decisões do STF exigindo a remoção de conteúdo e perfis de redes como Rumble e Twitter, que Trump chamou de “ordens secretas e ilegais de censura às plataformas de rede social dos EUA”.

A carta também justificou as medidas de guerra comercial alegando “que devemos nos afastar da relação comercial de longa data e muito injusta” com o Brasil. Ela afirmou absurdamente que as relações comerciais com o Brasil geram um “déficit comercial insustentável contra os Estados Unidos” e que “o número de 50% é muito inferior ao necessário para ter condições equitativas”. Na realidade, os Estados Unidos mantêm um padrão consistente de superávit comercial com o Brasil, com as exportações americanas superando as importações em US$ 7,4 bilhões em 2024.

As tarifas, que entram em vigor em 20 dias, impactam profundamente a economia brasileira, que tem nos EUA seu segundo maior mercado exportador, atrás apenas da China. 

Representantes do agronegócio brasileiro, um setor que exporta massivamente produtos como suco de laranja, café e carne bovina aos EUA, disseram estar alarmados com as medidas de Trump. As tarifas também impactarão a indústria siderúrgica brasileira, cujas exportações volumosas para os EUA já haviam sido atingidas por uma elevação das tarifas para 25% em março e depois para 50% em junho. 

Medindo as implicações do anúncio de Trump, o presidente do Instituto Aço Brasil, Marco Polo Lopes, declarou ao Estado de S. Paulo: “Tudo caminhava para um acordo. Agora, ficou imprevisível”. Demandando que as autoridades brasileiras mantenham o esforço de negociar, ele concluiu: “Isso não é bom para nenhum dos lados”.

As medidas anunciadas por Trump desafiam as tentativas de apresentá-las sob o viés da “negociação”. Seu sentido é o de dobrar o governo brasileiro e impor uma relação de dominação imperialista aberta garantida pela força.

Elas seguem a mesma lógica das tarifas anunciadas em janeiro deste ano contra a Colômbia, após o presidente Gustavo Petro recusar o recebimento de voos transportando imigrantes deportados dos EUA sob condições degradantes. Trump respondeu anunciando tarifas de 25% contra produtos colombianos, e Petro recuou.

A lógica política dessas medidas foi analisada pelo Grupo Socialista pela Igualdade (GSI) durante o Ato Internacional de Primeiro Maio deste ano: “O retorno de Trump à Casa Branca marca um realinhamento da política externa do imperialismo americano para a dominação do Hemisfério Ocidental, vista como um passo necessário à sua ofensiva contra a China”.

A declaração citou o Almirante Alvin Holsey, chefe do Comando Sul (SOUTHCOM) dos EUA, que declarou em um discurso ao Congresso dos EUA em fevereiro: “A região [América Latina e Caribe] está na linha de frente de uma disputa decisiva e urgente para definir o futuro do nosso mundo. A China está atacando os interesses dos EUA em todas as frentes, em todos os domínios”. Washington “deve responder à presença com presença”, concluiu Holsey.

De maneira significativa, o anúncio de Trump vem em seguida da cúpula dos BRICS, que foi realizada no último final no Rio de Janeiro. Um grupo formado inicialmente por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, ele incorporou no ano passado mais meia dúzia de países. 

Em um confronto ao governo Trump, a declaração final dos BRICS defendeu uma ampla reforma da ONU; que cada país deve ter o direito de estabelecer seus próprios marcos regulatórios para as grandes empresas de tecnologia; criticou o protecionismo comercial, condenando a imposição de tarifas e barreiras que prejudicam o comércio internacional; e repudiou os recentes ataques à Rússia e ao Irã, um dos países que ingressou nos BRICS no ano passado.

No entanto, a cúpula — e a liderança de Lula em particular — fez de tudo para não incomodar Washington e não mencionou os EUA como os responsáveis pelo bombardeio criminoso ao Irã.

Antes de anunciar as tarifas sobre os produtos exportados do Brasil, Trump já havia ameaçado no início da semana que qualquer país que se alinhasse às políticas “antiamericanas” dos BRICS estaria sujeito a uma tarifa extra de 10%.

Em uma declaração emblemática, o ministro da Fazenda do governo Lula, Fernando Haddad, declarou após a cúpula que “o Brasil tem relações com o mundo inteiro” e “não pode se tornar um apêndice de um bloco econômico [ou seja, os BRICS]”. Demonstrando sua falta de coragem e cegueira, Haddad procurou tranquilizar a opinião pública, declarando: “Tem uma equipe do presidente Lula sentada à mesa com o governo americano tratando do nosso acordo bilateral”.

 A carta de Trump provocou pânico no governo brasileiro. Após uma reunião de emergência no Palácio do Planalto, Lula declarou nas redes sociais: “O Brasil é um país soberano, com instituições independentes que não aceitará ser tutelado por ninguém”. O governo também anunciou que imporia tarifas recíprocas contra os EUA.

Em uma referência a Bolsonaro, que no início de 2023 liderou um golpe de Estado no Brasil que se espelhou no golpe de Trump de 6 de Janeiro de 2021, Lula disse: “O processo judicial contra aqueles que planejaram o golpe de Estado é de competência apenas da Justiça Brasileira e, portanto, não está sujeito a nenhum tipo de ingerência ou ameaça que fira a independência das instituições nacionais”.

Em entrevista ao Jornal da Record na quinta-feira, Lula expressou seu espanto com a carta e reafirmou seu interesse desesperado em restabelecer a base para negociações com os EUA. Ele disse:

Olha, eu achei que a carta do presidente Trump era um material apócrifo... O Brasil é um país que se o presidente Trump conhecesse um pouquinho, ele teria mais respeito.... O Brasil tem 200 anos de relação com os Estados Unidos. Uma relação diplomática, uma relação, sabe, virtuosa, uma relação de benefício para ambos os lados. Eu me dei bem com todos os presidentes, eu me dei bem com o Clinton, eu me dei bem com o Bush, eu me dei bem com o Obama, eu me dei bem com o Biden. 

Ao mesmo tempo, o PT e seus aliados pseudo-esquerdistas reforçaram sua campanha nacionalista reacionária, acusando Bolsonaro e seus aliados de “antipatriotismo” e exaltando os interesses comuns da burguesia brasileira que eles representam.

A mídia corporativa brasileira também reagiu com nervosismo ao anúncio de Trump. Os principais jornais burgueses publicaram editoriais criticando duramente as tarifas de Trump e elogiando Lula pelas medidas tomadas até agora. O Estado escreveu que “trata-se de coisa de mafiosos” e criticou Bolsonaro e seus aliados, especialmente o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas.

Freitas culpou Lula pelas tarifas impostas por Trump, alegando que o presidente “colocou sua ideologia acima da economia, e esse é o resultado. Tiveram tempo para prestigiar ditaduras, defender a censura e agredir o maior investidor direto no Brasil. … Não adianta se esconder atrás do Bolsonaro.”

Em uma declaração emblemática, o presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara, Filipe Barros, do Partido Liberal (PL) de Bolsonaro, declarou que “Lula está de forma reiterada provocando o governo dos Estados Unidos... se alinhando aos países do chamado ‘eixo do mal’”. 

Ao mesmo tempo, a atitude que prevaleceu na mídia brasileira é de enorme complacência. “O histórico de decisões anunciadas mas nunca efetivadas de Donald Trump faz duvidar da implementação das tais tarifas adicionais”, escreveu a Folha de S. Paulo em editorial. 

O Estado, por sua vez, afirmou: “[A] família e aliados do ex-presidente [Bolsonaro] comemoraram como se tivessem ganho um bilhete premiado da loteria. E acreditam que até o dia do julgamento no STF, novas manifestações virão. ... O improvável é que elas livrem Bolsonaro da quase certa condenação e da sentença de prisão. E, mais improvável ainda, é que à exceção dos seus apoiadores fanáticos, um único brasileiro se comova com as palavras de Donald Trump.”

A ideia de que Trump está apenas blefando, ou que suas medidas são inconsequentes, é falsa e perigosa. Para o Brasil, que viveu sob uma ditadura sangrenta apoiada pelos Estados Unidos entre 1964 e 1985, a escalada da ofensiva imperialista marcada pela declaração de Trump tem consequências profundas.

Bolsonaro e sua cúpula militar fascista responderam ao processo judicial contra o golpe de Estado que conspiraram entre 2022 e 2023 com uma ofensiva política. Em diferentes ocasiões, Bolsonaro e seus aliados mais próximos apresentaram os Estados Unidos como centro de articulação dessa resposta política.

O filho de Bolsonaro, Eduardo, está nos EUA desde fevereiro, em intensas reuniões com legisladores republicanos para que o governo Trump implemente medidas contra o STF e o governo Lula em resposta ao julgamento que seu pai enfrenta no Brasil. A recente medida anunciada por Trump marca um ponto de inflexão nessa ofensiva, que terá efeitos explosivos no Brasil.

Em entrevista à CNN antes do anúncio das tarifas por Trump, Eduardo Bolsonaro afirmou esperar sanções dos EUA contra o juiz do STF Alexandre de Moraes, dizendo: “É o que sempre busquei aqui nos EUA, já que no Brasil não existem ferramentas”.

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