O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (Partido dos Trabalhadores – PT) e as centrais sindicais brasileiras utilizaram o Primeiro de Maio para oferecer uma armadilha política para os trabalhadores e jovens no Brasil enfrentando uma brutal exploração capitalista e exaustivas jornadas de trabalho .
Tanto no discurso em cadeia nacional de rádio e TV de Lula na véspera do Primeiro de Maio quanto nos atos das centrais sindicais, a principal reivindicação foi a redução da jornada de trabalho no Brasil de 44 horas para 40 horas por semana sem redução salarial e o fim da escala 6x1 (seis dias de trabalho, um de folga), predominante nos setores de comércio e serviços que funcionam nos fins de semana.
O fato de essa demanda ter viralizado nas redes sociais no final de 2023 e continuado repercutindo desde então revela o abismo crescente entre a classe trabalhadora e os sindicatos. Dominadas há muito tempo por burocracias pró-capitalistas desacreditadas, essas organizações não conseguem fazer qualquer apelo aos trabalhadores que enfrentam níveis crescentes de exploração.
No final daquele ano, o atendente de farmácia Ricardo Azevedo publicou um vídeo no TikTok denunciando a escala 6x1, criando depois o chamado Movimento Vida Além do Trabalho (VAT). Na eleição municipal do ano passado, ele foi o vereador mais votado do pseudoesquerdista Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) no Rio de Janeiro.
Enfrentando um índice de aprovação em declínio em meio ao aumento da inflação e ao impacto de suas políticas de austeridade, Lula passou a apoiar verbalmente essas demandas populares como forma de tentar conter a crise crescente de seu governo. Juntamente com iniciativas como um projeto de lei que zera o imposto de renda para aqueles que ganham até R$ 5.000 por mês, ele está lutando para chegar na eleição presidencial do ano que vem em melhores condições.
Em seu discurso, Lula disse que “vamos aprofundar o debate sobre a redução da jornada de trabalho vigente no país, em que o trabalhador e a trabalhadora passam seis dias no serviço e têm apenas um dia de descanso.”
No ato de Primeiro de Maio liderado pela Força Sindical – a segunda maior central sindical brasileira criada no início da década de 1990 para defender políticas neoliberais e “modernizar” as relações trabalhistas –, o ex-burocrata sindical e ministro do trabalho do governo Lula, Luiz Marinho, explicou que a redução da jornada de trabalho não irá acontecer “num passe de mágica”.
Segundo ele, “é preciso de convencimento, é preciso chamar a atenção do empresariado brasileiro para que quem pode ganhar é o Brasil, são as empresas. Melhorar a condição de trabalho, melhorar o ambiente de trabalho ... ajuda a melhorar absenteísmo, ajuda a melhorar a qualidade do produto, ajuda a melhorar a produtividade.”
O vereador e líder do VAT, Azevedo, saudou no X/Twitter o discurso de Lula, dizendo que “O próximo passo importante é o governo federal começar a articular no Congresso, a bancada do governo começar a articular, inclusive para que o presidente da Câmara [Hugo Motta] despache a nossa PEC [Proposta de Emenda Constitucional]”. Por iniciativa da deputada federal Erika Hilton, também do PSOL, tramita no Congresso brasileiro um projeto de lei para acabar com a escala 6x1 e instituir uma jornada de trabalho de 36 horas por semana, com quatro dias de trabalho por semana, sem redução salarial.
A perspectiva falida que une Marinho, Azevedo, o PT e o PSOL parte da falsa premissa do nacionalismo burguês de que trabalhadores e empresários no Brasil compartilham um interesse comum, além do fato de que a redução da jornada de trabalho e a abolição da escala de 6x1 podem ser feitas no interesse do capitalismo brasileiro e do “desenvolvimento nacional”. Ao mesmo tempo em que encobrem o caráter objetivo da exploração capitalista, eles também buscam vincular os trabalhadores ao Estado burguês falido e semear ilusões de que o reacionário Congresso brasileiro pode ser pressionado a aprovar a PEC.
Estudos recentes destacaram que existem interesses opostos entre a classe trabalhadora e o capitalismo nessa questão. Um estudo do Instituto de Economia da UNICAMP, reportado pela Folha de S. Paulo em 1º de maio, mostrou que o fim da escala 6x1 beneficiaria diretamente 37% dos trabalhadores formais e indiretamente 38% dos trabalhadores informais.
Por outro lado, de acordo com a reportagem, um estudo diferente encomendado pela federação industrial de Minas Gerais mostrou que a redução da semana de trabalho de 44 para 36 horas, com quatro dias úteis e três dias de descanso, aumentaria os custos trabalhistas das empresas em 22%.
Outra marca deste Primeiro de Maio no Brasil foi a divisão entre as maiores centrais sindicais. Desde 2019, no primeiro ano do governo do presidente fascistoide Jair Bolsonaro, a CUT, a central sindical controlada pelo PT, a Força Sindical e outras cinco centrais sindicais brasileiras estavam realizando atos conjuntos. Lula participou de todos eles, o que preparou o caminho para as centrais sindicais apoiarem de forma inédita o candidato petista na eleição presidencial de 2022.
Neste ano, a CUT decidiu não participar do ato liderado pela Força Sindical, alegando discordar do formato do evento em São Paulo que, além da presença artistas renomados para inflar o público, contou com o sorteio de dez carros.
Na verdade, a CUT e Lula, que também se ausentou do ato, buscaram se distanciar da Força Sindical e das outras centrais sindicais no Brasil temendo que neste ano o ato de Primeiro de Maio pudesse repetir o fiasco do ano passado, quando Lula discursou para menos de duas mil pessoas, a grande maioria burocratas sindicais, na zona leste de São Paulo, uma região de “grande concentração operária”, como alegaram na época.
A CUT e seus sindicatos afiliados resolveram realizar um ato em São Bernardo dos Campos, na região industrial do ABC, berço político do PT. Isso também deu a oportunidade para eles defenderem e promoverem abertamente o governo Lula, fazendo um apelo para que o público presente participasse da construção de uma “rede de militância nacional” digital para disseminar conteúdo pró-governo.
O que está por trás dessa manobra é o descrédito dos sindicatos brasileiros, com seu longo histórico de colaboração com as empresas e o Estado contra a classe trabalhadora. Anos de acordos vendidos, isolamento sistemático de greves e desvio das lutas dos trabalhadores para o beco sem saída dos tribunais burgueses e do Estado levaram a uma redução maciça de empregos com salários bem pagos e a uma erosão das conquistas históricas dos trabalhadores.
Essa tendência histórica é constatada pelos dados mais recentes. Em 2023, a taxa de sindicalização dos trabalhadores brasileiros caiu para 8,4%, o nível mais baixo desde o início dos números oficiais em 2012, quando era de 16%.
O Primeiro de Maio no Brasil também expôs a pseudoesquerda brasileira, que convocou atos supostamente “independentes” para construir uma “oposição de esquerda” ao governo Lula. O principal veículo nesse sentido foi a CSP-Conlutas, a central sindical controlada pelo morenista Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU), que serviu como um polo aglutinador de várias organizações políticas morenistas, pablistas e stalinistas.
No ato convocado pela CSP-Conlutas na avenida Paulista, em São Paulo, o dirigente do PSTU e da CSP-Conlutas, Altino Prazeres, denunciou que o ato das outras centrais sindicais é “financiado por grandes empresários, no ato deles tem sorteio de carros financiados por esses mesmos grandes empresários, no ato deles eles querem dizer amém a todos os governos. E aqui não. Aqui é um ato ... classista.”
Essas palavras foram refutadas pelos próprios aliados do PSTU do Movimento Revolucionário dos Trabalhadores (MRT), uma outra corrente morenista afiliada ao Partido Socialista dos Trabalhadores (PTS) da Argentina. Ele escreveu no Esquerda Diário que, apesar de a CSP-Conlutas ser supostamente “a única central [sindical] que mantém posições de independência política”, ela “está atuando na contramão deste sentido no Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte e outras localidades onde vem defendendo a construção de um ato unificado com as centrais sindicais, se subordinando inclusive a bandeiras governistas em alguns casos.”
A realização de um ato separado pela CSP-Conlutas segue uma lógica política definida: para preservar seu papel de retaguarda “de esquerda” para o aparato sindical corporativista, ela deve se diferenciar das seções mais inescrupulosas da burocracia pró-capitalista.
Por sua vez, o MRT denuncia os negócios sujos entre a CSP-Conlutas e os sindicatos tradicionais para defender sua perspectiva falida de que a central sindical liderada pelo PSTU pode ser pressionado a aderir à uma política de “independência de classe”. Ambas as frações do morenismo trabalham, cada uma a seu modo, para preservar o domínio das burocracias nacionalistas desacreditadas sobre a classe trabalhadora brasileira.
Em seu pacto nacional-oportunista, o Esquerda Diário ignora despreocupadamente a promoção belicosa do PSTU da guerra imperialista dos EUA-OTAN contra a Rússia na Ucrânia e a posição cada vez mais pró-guerra que está sendo desenvolvida pela CSP-Conlutas. Como denunciado pelo WSWS, a central sindical organizou recentemente um seminário reacionário em aliança com forças chauvinistas e fascistoides que promovem o investimento na indústria de defesa brasileira em meio às crescentes ameaças de guerra nuclear.
Como o Comitê Internacional da Quarta Internacional (CIQI) insistiu em seu Ato Online Internacional de Primeiro de Maio, o processo de globalização capitalista das últimas décadas deu um caráter global aos ataques das elites dominantes mundiais, ao mesmo tempo que unificou enormemente a classe trabalhadora internacional.
É por isso que a solução para os problemas que a classe trabalhadora brasileira enfrenta, desde as exaustivas jornadas de trabalho, passando pelas reformas contra os trabalhadores até as medidas de austeridade do governo Lula, não pode ser encontrada em lutas puramente nacionais e sindicais, por mais militantes que sejam.
A classe trabalhadora brasileira “deve se libertar do controle dos partidos políticos pró-capitalistas e das burocracias sindicais”, escreveu David North em seu discurso do Primeiro de Maio, e “repudiar todas as variedades de nacionalismo reacionário”. O que é necessário é a unidade da classe trabalhadora internacional sob a bandeira do socialismo internacional.
Esse foi o programa que o CIQI avançou em seu ato de Primeiro de Maio. Fazemos um chamado para que os trabalhadores brasileiros estudem os discursos apresentados e juntem-se ao Grupo Socialista pela Igualdade, que está lutando para construir a seção brasileira do CIQI.