Os professores da rede pública municipal de São Paulo, uma das maiores redes de ensino das Américas, decidiram em 23 de abril continuar uma greve por tempo indeterminado iniciada em 15 de abril por melhores salários e contra a privatização da educação. Em 16 de abril, os servidores públicos de São Paulo também entraram em greve contra os amplos ataques aos serviços sociais do prefeito Ricardo Nunes, um aliado próximo do ex-presidente fascista Jair Bolsonaro.
O início da greve dos professores de São Paulo aconteceu depois de uma greve de um dia em 18 de março e paralisações regionais entre o final de março e o início de abril.
O estopim desse movimento foi a alteração da jornada de trabalho dos professores readaptados e daqueles em licenças médicas superiores a 30 dias que fez com que o salário deles diminuísse em um terço a partir de abril. Os professores readaptados estão afastados definitivamente de sala de aula principalmente por problemas de saúde mental e realizam trabalhos administrativos nas escolas.
O prefeito Nunes também possui a intenção de rever a condição dos professores readaptados, podendo fazer com que eles voltem às salas de aula. Além dos inúmeros efeitos sobre eles, isso poderá efeito cascata sobre as escolas, com a possibilidade de muitos professores terem que deixar suas turmas e serem demitidos.
Mesmo com essa perspectiva, o maior sindicato dos professores da rede pública municipal de educação, o SINPEEM, se recusou a iniciar uma greve imediatamente, uma medida que era amplamente apoiada pelos professores. Na assembleia de 18 de março realizada durante a greve de um dia, a burocracia sindical semeou deliberadamente uma confusão entre os professores para aprovar as paralisações regionais e uma nova assembleia geral com indicativo de greve apenas para 30 de abril.
Isso permitiu que o governo Nunes apresentasse em 10 de abril um projeto de lei para reajustar o salário dos professores em 2,6% neste ano e no ano que vem. Esse valor está abaixo da inflação geral de 5% e é ainda menor do que a inflação de 10% de alimentos no ano passado em São Paulo. Desde o início da pandemia de COVID-19, os professores de São Paulo acumulam perdas salariais de 44% relativas aos abonos não incorporados aos salários e à inflação crescente nos últimos anos.
Como parte de um ataque global promovido pelas elites dominantes globais contra a educação pública, intensificado pelo agravamento da crise econômica na última década, as condições de trabalho nas escolas da rede pública municipal de São Paulo tornaram-se intoleráveis. Entre os educadores, cresce a sensação de esgotamento físico e emocional, resultado de jornadas exaustivas e da precarização crescente do trabalho docente.
Proliferaram-se contratos precários temporários, faltam funcionários para atender um número crescente de alunos com dificuldades de aprendizagem e aumentaram os programas pró-corporativos na educação, com a implementação de muitas avaliações externas e metas irreais para serem cumpridas pelas escolas. Esse processo está preparando o caminho para uma ampla privatização da educação pública em São Paulo, com Nunes já tendo anunciado uma parceria público-privada (PPP) para a construção e a gestão de escolas pela iniciativa privada.
Alinhado ao ex-presidente Bolsonaro e ao governador de extrema direita de São Paulo, Tarcísio de Freitas, Nunes também tem sido um defensor da militarização de escolas. Isso inclui a implementação das escolas assim chamadas cívico-militares na rede pública municipal e a presença ostensiva da Guarda Civil Municipal em 20 escolas de São Paulo consideradas violentas, um número que pode aumentar para 800.
Num ataque ao direito de greve, Nunes ingressou na justiça para considerar a greve abusiva e conseguiu uma liminar exigindo que as escolas funcionem com 70% dos professores. Ele também ameaçou os professores grevistas, dizendo que a educação é “um serviço essencial”, que eles “utilizam de ações político-partidárias para conturbar o processo pedagógico” e que a prefeitura está “monitorando [as escolas] para fazer a punição daqueles que utilizarem desse tipo de recurso contra a educação, contra as crianças”.
Como consequência, a Secretaria Municipal de Educação tem cobrado das escolas os nomes dos professores grevistas. As escolas estão recebendo e-mails diariamente solicitando “a coleta de informações sobre a paralisação” e advertindo que a “equipe escolar sobre a necessidade de atendimento sob pena de multa”. Os professores, no entanto, estão desafiando essa ameaça.
A atual greve é a expressão mais recente da combativa militância dos professores da rede municipal de São Paulo em defesa de suas condições de trabalho e de vida. Ao longo da última década, eles enfrentaram sucessivos ataques à educação pública e aos direitos sociais realizados por diferentes governos, inclusive o do petista Fernando Haddad (2013-2016). Diante desse histórico e de uma explosiva situação mundial, esta greve traz questões cruciais de perspectiva política.
Em primeiro lugar, é necessária uma avaliação crítica do papel que os sindicatos, que têm um amplo histórico de isolar e desviar a luta dos professores para os partidos políticos burgueses. Como consequência, existe um sentimento crescente entre os professores de que suas greves e lutas serão traídas pela burocracia sindical.
Os dois sindicatos de professores da rede pública municipal, o SINPEEM e a APROFEM, marcaram antes da decretação da greve paralisações e protestos em dias diferentes. Com a aprovação em primeira votação do projeto de lei que regulamenta o reajuste salarial dos professores em 2,6% neste ano e no ano que vem, a burocracia sindical do SINPEEM decidiu unilateralmente cancelar o protesto que estava marcado para quinta-feira e chamar uma nova assembleia e protesto para o dia 29 de abril em frente à Câmara Municipal, quando está prevista a segunda votação do projeto de lei.
Com medo de que a luta possa sair de seu controle, a burocracia sindical também está fazendo tudo o que pode para que não haja uma luta unificada de fato entre os professores e outras categorias dos servidores públicos municipais em greve. Além disso, existe entre os professores municipais uma vontade ampla de esse movimento se unificar com os professores da rede pública estadual de São Paulo, que realizaram uma paralisação na sexta-feira contra os ataques similares do governador Tarcísio à educação e aos direitos sociais.
A incapacidade e a falta de vontade de os sindicatos unificarem as lutas não são uma consequência apenas de uma burocracia sindical corrupta, mas da própria transformação que eles sofreram com a globalização capitalista. Para romper o domínio exercido sobre os professores, é necessário uma luta que emerja de baixo para cima, organizada por comitês de base independentes, capazes de desafiar tanto a burocracia sindical quanto o sistema capitalista a que ela serve.
Em segundo lugar, os professores de São Paulo devem enxergar sua greve como parte de um amplo movimento da classe trabalhadora brasileira e internacional. Professores e servidores públicos de diversas cidades e estados brasileiros têm realizado greves frequentes desde o início do ano, reivindicando melhores salários e resistindo aos constantes ataques aos serviços públicos.
Na arena internacional, esse movimento também está ganhando força especialmente nos Estados Unidos, onde cresce a mobilização contra o governo do presidente Donald Trump e o chefe do Departamento de Eficiência Governamental, Elon Musk. Os ataques sem precedentes deles estão desmontando as conquistas sociais de séculos conseguidas por lutas massivas da classe trabalhadora americana.
Por fim, os ataques à educação, no Brasil e no mundo, estão profundamente ligados à escalada da elite dominante rumo à guerra e ao fascismo, numa tentativa desesperada de resolver sua crise terminal. Por isso, lutar em defesa da educação exige, necessariamente, enfrentar a raiz do fascismo e da guerra: o sistema capitalista.
Como o Comitê Internacional da Quarta Internacional (CIQI) deixou claro em sua convocação para a Ato Online de Primeiro de Maio deste ano, a situação explosiva no Brasil e em todo o mundo “enfatiza a necessidade urgente de um movimento internacional unificado da classe trabalhadora, que está se mobilizando cada vez mais contra a guerra, a desigualdade e a repressão”. Fazemos um chamado a todos os interessados em conhecer o programa socialista e internacionalista defendido pelo CIQI para que participem do Ato Online de Primeiro de Maio inscrevendo-se aqui.